Um dos traços característicos do
contemporâneo português passa por uma cada vez mais difícil relação com a
verdade.
Transpondo para as sessões
de Câmara e Assembleia Municipal, no espaço público, tudo pode ser ou
não ser, com a mesma naturalidade, a mesma plausibilidade, a mesma
legitimidade, todos os dias, debaixo dos nossos olhos, e em larga escala,
as poucas verdades incómodas acabam transformadas em meras opiniões. E, assim,
de modo tão subtil quanto eficaz, a verdade acaba por ser perturbada, mais do
que por mentiras ou falsificações deliberadas, sobretudo pela opinião. Opinião
em que tudo se equivale e tudo se dilui.
Neste universo construído por
este município, e que choca a quem vem não esta habituado a esta dialética,
confunde-se realidade, aparência e percepção, o resultado é a completa implosão
do nosso sentido de orientação no mundo real. Muito mais do que fazer da
mentira verdade ou da verdade mentira, o objectivo é a efectiva confusão das
coisas.
Enquanto País prestes a retomar a
sua soberania e findo o tratado de assistência financeira, está na hora de
debater e obter consenso, sobre “que
Estado podemos ter” e “que Estado
queremos ter”.
Acredito que do “podemos” ao
“queremos”, vai um caminho longo e de trabalho árduo.
Se não compreendermos esta
necessidade, repito, a necessidade de debater e obter consensos, os próximos
atos eleitorais, para as europeias ou para as legislativas, não serão
responsáveis e não terão o contributo útil para a democracia, para a qual tanto
nos debatemos para manter. Será sinónimo que afinal não compreendemos do que se
alimenta a democracia e a nossa soberania.
O papel dos partidos políticos,
entre outros papéis importantes, deverá passar por promover uma verdadeira
avalancha de informação credível e de exercícios múltiplos de debate nos meios
de comunicação social, seja serviço público ou não, para que o debate seja
alargado, pedagógico e transparente.
Não podemos permitir, mais uma
vez, que os debates se nivelem por transmissão de conteúdos opacos, evasivos,
manipuladores de intenção de voto, porque esta é a derradeira oportunidade de
nos colocarmos em pelotão defensor da nossa autonomia.
Queremos consolidar a integração
europeia? É nossa obrigação participar ativamente nesse projecto.
Queremos um Estado Social? É
nossa obrigação compreender o caminho para o construirmos, quanto custa e o que
deve assegurar.
O nível de endividamento que
atingimos e que nos obrigou às condições contratuais implacáveis do empréstimo
da troika, colocou em causa muitas funções do Estado e a questão da
sustentabilidade, embora argumento válido, instalou o medo de diminuição do
Estado Social.
O CDS-PP não advoga a redução das
responsabilidades do Estado, nem tão pouco defende a diminuição do Estado
Social. O que se pretende, visando a sustentabilidade, é que o caminho para o
Estado Social passe pela revisão do que o Estado faz, como faz, quanto custa
fazer e como se sustenta.
Não custa perceber que se a
população activa diminuiu, as contribuições também diminuíram e portanto o
modelo que sustenta os apoios sociais e a distribuição de verbas está em risco
e se não alterarmos esse modelo, continuaremos a recorrer ao endividamento para
o sustentar. Tal não se pode repetir.
Também os orçamentos municipais,
não podem desenvolver-se ao ritmo da incompetência dos executivos ou das
ambições eleitoralistas. Apesar de aprovada a Lei das Finanças Locais e do
tecto para o endividamento, o esforço para bem gerir as verbas e racionalizar
custos, está longe da realidade que já se verifica dentro da casa dos
portugueses.
Se determinada câmara quer
determinada obra, em primeiro lugar, deve garantir que tal se encontra
devidamente cabimentado no seu orçamento, sem recurso a aumentar o seu nível de
endividamento, cumprindo prazos e não permitindo derrapagens. Essa opção deve
estar sustentada, justificada e inserida numa política de desenvolvimento, que
não precisa de dar lucro, mas deve garantir o retorno em benefícios para a
população. Basta de navegar à vista!
Assegurar autonomia de decisão
passa pela boa gestão dos orçamentos, contar com o real e abandonar a lamúria
de mão estendida ao Governo da República, ignorando o cumprimento das Leis, que
são para todos.
Em boa verdade ao executivo municipal,
exige-se não só bom senso, mas muita capacidade e boas práticas de gestão dos
dinheiros públicos.
As competências dos municípios,
neste mundo moderno, não podem limitar a fazer obra e gerir sem planificação.
Neste mundo global, nesta Europa que se quer capaz de dar o exemplo de
desenvolvimento social, todos têm a sua quota de intervenção e de
responsabilidade na construção do Estado Social, tendencialmente mais justo,
coeso e centrado no combate às desigualdades.
Um município, na sua ordem de grandeza,
deve gerir o seu território tendo como objectivo principal a garantia da sua
sustentabilidade.
Cabe-lhe simplificar processos
porque está em causa eficiência de serviços e recolha de receita. Cabe-lhe
atrair investimento, porque cria emprego, melhora o rendimento das famílias e a
sua funcionalidade, contribui para a natalidade, aumenta a receita do município
e contribui para a coesão social. Cabe-lhe procurar parcerias, rentabilizar o
investimento na preservação do património e da sua identidade contribuindo para
a melhoria de vida da sua população e promovendo o turismo. Cabe-lhe contrariar
a tendência de município dormitório ou a tendência para a desertificação.
Cabe-lhe ter políticas a longo prazo, prazo maior que as próximas eleições.
Cabe-lhe ambição e patriotismo.
A par desta mudança de paradigma,
também já lhes é exigido transparência e neste capítulo cabe às oposições o
apurar de responsabilidades, o contrapropor construtivamente, zelando pelos
interesses dos munícipes, sem se renderem ao eleitoralismo.
Convença-se, quem ainda não
percebeu, que entre a verdade, a transparência e boa gestão e a mentira de uma
obra inaugurada em vésperas de eleições com agravamento do endividamento e
encoberto por manobras de contas no orçamento, não terá a correspondente
factura, pois esta crise marcou mais a geração da população activa e de
pensionistas, do que o 25 de Abril com as suas promessas.
Apesar de a verdade dever ser
referência, tudo se baralha e subverte.
Desde logo, como condição da
eficácia, o segredo inexiste. Os factos são do domínio público e convidam
à discussão na praça pública. Emerge a opinião e o direito à opinião.
Todos são livres de participar e, sem
hesitações, participam.
Apesar de lhes faltar informação
fidedigna, apesar de estarem desprotegidos quanto à fragmentação dos factos,
apesar de serem altamente vulneráveis à propaganda, todos intervêm, discutem e
opinam.
No fim, é o grande circo. Mas, porque
o que parece tanto pode ser como não ser, certo é que, se não mudarmos de caminho,
apenas a dúvida sobrará.
E, nessa altura, talvez tarde demais,
perceberemos todos que nos falta o chão debaixo dos pés.
CPC CDS ALCOCHETE
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