Em Setembro do ano passado, para orgulho do Município de Alcochete, a Associação Portuguesa de Planeadores do Território (APPLA) distinguiu este com a Bandeira de Ouro da Mobilidade, atendendo ao conjunto de trabalhos que segundo informação da CM eliminaram 70% dos obstáculos arquitectónicos, tornando o espaço público mais acessível a todos os cidadãos e privilegiando a circulação pedonal.
Todavia para o munícipe que se desloca diariamente a pé ou de bicicleta no concelho, bem como para o tão esperado turista que nos visita, nada disto é realmente perceptível! Será porque nunca aconteceu verdadeiramente com a dimensão anunciada e a Bandeira de Ouro recebida é igual ao Nobel do Obama? Ou seja, ainda não se fez nada mas “peguem” lá um prémio pois acreditamos que em seu tempo algo será feito!
Infelizmente para o Município a mobilidade urbana orientada ao cidadão como elemento primário à sociedade e não ao automóvel como se tem vindo a verificar ao longo das últimas décadas, é uma área de grande visibilidade pública que pela sua utilização directa é obviamente difícil de esconder a “obra-não-feita”. Sobretudo quando ambas as instituições responsáveis pela concretização de um verdadeiro modelo de mobilidade urbana, relativamente à construção, sinalização e fiscalização dos espaços destinados aos peões, se mostram tão desinteressadas como não cumpridoras das suas obrigações para com o cidadão, como é o caso do Município local e da Guarda Nacional Republicana de Alcochete.
Afinal pagamos impostos para viver neste concelho mas a utilização do meio de locomoção mais primário, saudável e gratuito que conhecemos, nomeadamente as nossas pernas, é certamente limitada quer em segurança dado o risco de sermos atropelados ao sermos frequentemente convidados a caminhar na faixa de rodagem pela falta ou obstrução dos passeios, como o de esbarrarmos contra uns postes, contentores ou automóveis estacionados, bem como na possibilidade de levarmos uma lembrança para casa como os demais dejectos caninos encontrados em quase todos os espaços pedonais. Isto para quem caminha sem limitações físicas, pois quem infelizmente não o pode fazer como resultado de uma condição de mobilidade reduzida, como os mais idosos, deficientes, e bebés nos seus respectivos carrinhos, é vergonhoso e insultuoso o actual modelo em vigor no concelho.
Modelo este onde é sistemático o estacionamento ilegal de automóveis em cima dos passeios, embora o Código da Estrada no artigo 49º defina que é proibido parar ou estacionar nos locais destinados ao trânsito de peões sem excepções incorrendo à respectiva coima. E refira-se sem excepções pois estacionar em cima do passeio obstruindo o mesmo à passagem das pessoas, porque se quer o automóvel em frente à porta de casa por comodismo, à entrada do restaurante ou sobretudo para que este não fique ao sol, não só não está contemplado na lei como excepção como é um acto ilegal, abusivo e desrespeitador pelo próximo.
Pois facilmente se verifica num formato diário e sistemático que os passeios do concelho com maior incidência na vila de Alcochete estão obstruídos por automóveis, quer pelo facto do Município nada ter feito até à data para resolver o grave problema da falta de lugares de estacionamento, seja pela aposta em novos espaços como pela atribuição e marcação horizontal dos lugares existentes, quer pelo facto da Guarda Nacional Republicana local não cumprir de forma proactiva com a sua obrigação estabelecida na lei, dando lugar a um sentimento de impunidade a que os portugueses neste país já há muito se habituaram. NÃO COMPENSA SER CUMPRIDOR!
Até porque frequentemente também são as viaturas da autarquia que estacionam de forma ilegal em cima das vias destinadas aos peões, muito especialmente à hora do almoço, ou quando se deslocam para as Reuniões da Assembleia como se verificou no passado 27 de Abril onde a viatura ficou a obstruir a passagem de peões com as duas rodas em cima do passeio num completo desrespeito pela lei e pelo cidadão! Não podemos pois com certeza esperar maior modernidade, civismo e garantia da liberdade pelo cumprimento da lei quando os responsáveis máximos não só não dão o exemplo como sobretudo não querem perceber que a mobilidade urbana começa nas pessoas e não nos automóveis. Será que a Bandeira de Ouro da Mobilidade foi atribuída unicamente pelo rebaixamento de passeios que actualmente servem especialmente como rampas de acesso ao estacionamento ilegal, para que os automóveis não se danifiquem quando sobem os mesmos?
Pois se afinal...
- Alcochete não tem ainda um metro que seja de ciclovias para que a tão esperada e saudável forma de mobilidade que é a bicicleta possa ser utilizada por todos de forma segura; Não garante a segurança dos peões que se deslocam a pé todos os dias entre Alcochete e São Francisco pela N119 quando a proximidade entre freguesias é tão curta e que pela simples falta do necessário espaço pedonal aliado ao excesso de velocidade automóvel que ali se pratica é perigosíssimo sobretudo para as crianças; O tão frequentado Fórum Cultural de Alcochete ainda obriga os seus visitantes a circularem a pé pela faixa de rodagem automóvel dada a inexistência de passeios como acesso ao mesmo correndo sérios riscos de atropelamento sobretudo à noite; Os ecopontos por decisão da empresa AmarSul estão em cima dos passeios obstruindo estes ao invés de utilizarem a berma da estrada para o efeito; Não existem acessos pedonais que liguem Alcochete ao Freeport tantos para que os visitantes venham ao centro da vila como para quem se desloque desta para lá trabalhar ou visitar; As ruas e praças sobretudo no núcleo histórico de Alcochete tais como o Largo António dos Santos Jorge embora requalificado continuam a permitir um misto de peões e automóveis onde ninguém sabe ao certo onde fica quem e acresce o risco de atropelamento de crianças que por ali brincam; O estacionamento abusivo e ilegal em cima dos passeios é demasiado frequente e a GNR mostra-se desinteressada e sistematicamente “fecha os olhos”; A passadeira destinada à travessia dos peões na Av. D. Manuel I (frente à estátua do Rei D. Manuel I) tem cerca de 30 cm de altura no seu acesso originando frequentemente quedas de idosos e não existem rampas rodoviárias para redução de velocidade nesta longa avenida; Não existem parques de estacionamento municipais com dimensão, gratuitos e visivelmente identificados com uma esperada localização estratégica para redução do excesso de automóveis no centro da vila e tornar esta mais segura e amiga do peão e do turista; Os dejectos animais são frequentes nas ruas do concelho; O Município de forma geral contínua sem obra feita na garantia da mobilidade dos peões e despreocupado para com o estacionamento automóvel organizado e disponível; Não se aposta em campanhas pedagógicas para que o condutor irresponsável perceba que a lei é para todos e o respeito pelo próximo é um acto de cidadania obrigatório; etc.
Perguntamos então com que critério a Bandeira de Ouro da Mobilidade foi atribuída? E será que por entre as 160.000 páginas bimensais do jornal municipal InAlcochete suportado financeiramente pelo contribuinte, a autarquia “não arranjaria para lá espaço” para uma mensagem periódica de sensibilização junto dos condutores para com o respeito legal pelos peões, sobretudo dos idosos, das crianças e dos deficientes? E a GNR esqueceu-se esta das suas obrigações ou terá receio de incomodar algum conhecido? Pois não sendo apologistas da coima, entendemos que o papel pedagógico é talvez o mais eficiente... Mas para aqueles que abusam e prevaricam de forma diária e sobretudo voluntária, a coima é com certeza o melhor incentivo ao cumprimento da lei.
Ainda recentemente a Sra. Presidente da Assembleia de Freguesia de Alcochete demonstrou um elevado conhecimento ao proferir um alongado discurso público no sentido que Alcochete ao contrário de outros países europeus continua a produzir demasiado lixo de forma irresponsável pelos infelizes hábitos que são pertença dos portugueses desde sempre, no sentido que as nossas ruas e passeios destinadas aos peões, estão sujas e pouco dignas para com o esperado turismo que Alcochete anseia. Só lamentamos que tal discurso não seja utilizado pelo Município internamente em benefício do concelho, bem como tão vasto conhecimento na mão da CDU para com o que se “gasta lá fora” não tenha chegado à área da mobilidade, dado que por cá ainda nada foi feito para melhorar as condições gerais nesta área, quando nos outros países europeus tal já foi superado há várias décadas...
Caminhar é pois um direito primário de mobilidade urbana, e quando as infra-estruturas para tal existem, as pessoas tendem inclusive a reduzir a utilização do automóvel para passarem a adoptar melhores e mais saudáveis hábitos de vida, como se tem verificado em outras regiões do nosso país, com a presença de ciclovias, e muito passeio livre para caminhar como parte de um moderno “circuito de manutenção” ou como alguns dizem: fazer uma caminhada antes do jantar. Felizmente ainda que pelo meio da estrada já se vêem muitos habitantes locais com tão bons hábitos...
O CDS/PP apela desta forma ao Município local que sejam feitos mais e melhores esforços para a concretização de uma política de mobilidade séria e respeitadora, quer pela atribuição de novos espaços pedonais em falta ou a recuperar, como pela construção de ciclovias, remoção de obstáculos, e a ligação entre freguesias e/ou áreas deslocadas do centro. Por outro lado é vital a concepção de um modelo de estacionamento eficiente pelo uso de sinalética e novos locais disponíveis ao condutor, para evitar o estacionamento selvagem resultante da falta deste e sentida há várias décadas, em sintonia com uma actuação profissional das forças de segurança na esperada fiscalização.
Alcochete merece mais, quem cá vive merece melhor, e quem nos visita agradece um espaço mais ordenado e acessível capaz de proporcionar um turismo de qualidade e até uma vida mais saudável.
Pois de outra forma diríamos que o Município de Alcochete deve esquecer a sua Bandeira de Ouro da Mobilidade e este ano inscrever-se na Semana Europeia da Mobilidade para perceber o que tem de ser feito para se ganhar tão aclamado e verdadeiro prémio, e até aproveitarem para mudarem de ares dado que a cerimónia de entrega dos prémios será em Bruxelas, pois lá com certeza verificarão que os passeios são mesmo para as pessoas, o automóvel é secundário, e a lei é para cumprir... Pois esta Bandeira de Ouro da Mobilidade atribuída ao Município infelizmente só pode mesmo ser comparada aos famosos prémios IgNobel criados pela revista de humor científico Annals of Improbable Research e entregues em Harvard para honrar estudos e experiências que primeiro fazem as pessoas rir, e depois pensar.
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